quarta-feira, 13 de julho de 2011

Uma data para o muito obrigado

Faz setenta anos que foi Instituído o Dia de Ação de Graças, e a terra agradece a quem teve tal iniciativa. Quando se erige uma data, é sinal de que havia uma “realidade”, no fundo dos corações, pedindo a instituição, esperando a escolha do dia. Aparentemente, parece que a gratidão está desaparecendo do mercado dos homens. Engano grande e perigoso. As pessoas agradecem muito mais do que se cogita. Os corações são mais delicados do que parecem. O “muito obrigado” sobe bem mais frequentemente ao céu do que suspeita e contabiliza a terra. Estamos, pois, de parabéns. Quanta coisa se faz, quando se data uma realidade humana! Primeiro, tem-se a impressão de que se para o tempo e se põe a pensar nalguma coisa, que do tempo não é, que tem um pronunciado sabor de eternidade, de Deus. Depois, se patenteiam os corações, mostrando flores em seu íntimo e perfume em suas mãos. Quem agradece tem arminho interior e guarda sedas inéditas, dentro de si. Uma data só poderá ser celebrada se o homem conseguir colocar-se fora e acima da corrida dos dias, da tremenda centrifugação das lidas, da disparada dos negócios, do intrincado cipoal das preocupações de hoje. E mais: se souber situar-se num mundo superno, interior também, de onde o coração se sente nascido, para onde se sabe dirigindo a cada dia que passa. Quem agradece diz fé, pronuncia-se em favor de uma esperança, sugere amor. Como que debruçado sobre o mapa-múndi da vida, afirma, de manso, que ela tem uma finalidade, que se não enrola em si mesma, criando desesperos de alma. Especialmente isto: quem agradece grita Deus; tem certeza da presença divina. Não se agradece sem direção, assim como não se atira a esmo. O “muito obrigado” contem uma presença de providência, uma encarnação de amor, uma imanência de atividade paterna. Quem agradece, como se falasse a Alguém face a face, tem certeza de uma verdade religiosa. Sente uma presença amiga. Abre-se com o Pai. Se for valer a lei da vida, que diz e prova: “só valorizamos uma coisa, quando a perdemos”, a gratidão nasce geralmente com os atrasos de quem sofre de um Pai perdido, de um Cristo relegado, de um Espírito contristado, de uma Igreja não conhecida, nem sentida, nem amada, como se deve. Ainda bem que surge, todos os anos, uma festa para avivar a memória da gratidão e introduzir, meio sem jeito, as pessoas no delicado mistério do “muito obrigado”. Segundo a lei do amor, quando se começa a sentir presenças tênues, quando dois seres, que uniram suas vidas numa só existência, passam a sentir um ao outro, em todos os instantes da vida e de todos os modos de viver, então a gratidão impera, as almas se irmanam, os corações cantam um antecipado céu, caído na terra, dentro de um lar. Com muito mais sentido, isso deve ser dito sobre a gratidão do homem em relação a Deus, por seus gestos de Pai. Um dia, nossa facilidade de “vê-lo” o surpreenderá em tantos flagrantes, de presença amiga, que a vida passa a ser um canto único de gratidão, um interminável estribilho de “muito obrigado, Senhor”.
(P. C. Vasconcelos Jr. – 1978)

Nenhum comentário:

Postar um comentário